O
ser, quer seja humano ou espiritual, se constitui de toda bagagem que lhe é
oportunizada agregar ao longo de sua existência, tanto no mundo material quanto
no espiritual. Alimenta-se de todas as
experiências e delas se vai constituindo, se fazendo existir. Assim sendo, não
há possibilidade de manifestar-se sem evidenciar qualquer característica das
vivências adquiridas e que, portanto, o constitui. Isso acontece em qualquer
situação, tempo e lugar, consciente ou inconscientemente. É importante trazer à
tona essa constatação quando se deseja abordar um tema que, no âmbito da
Doutrina Espírita, é tratado por Animismo.
Existem
muitas dúvidas acerca do significado da palavra “Animismo” e seu emprego na
literatura Espírita. O que realmente significa? Qual a sua origem e aplicação no
Espiritismo? Como e quando identificá-lo? Essas são
dúvidas recorrentes que só uma análise mais profunda das obras básicas e
complementares do Espiritismo poderá esclarecer.
A
palavra Animismo é uma derivação da palavra latina “anima” que significa “alma”
e do grego “anemos” = vento, que acrescido do sufixo “ismo” pode designar uma
“ação” ou uma “ideologia”.
A
opinião mais aceita é de que o termo foi criado por Georg Ernst Stahl, em torno de 1720, quando defendia a Teoria do
Animismo, cujo conceito principal era de que “a vida animal é produzida por uma alma imaterial”. No meio
espírita, passou a ser conhecida e utilizada após a publicação da obra “Animismo
e Espiritismo” em 1890, pelo grande pesquisador de fenômenos espíritas, o russo
Alexandre Aksakof, contestando as explicações materialistas para os fatos
espíritas apresentados por vários filósofos, dentre eles o principal, o alemão
Eduardo Von Hartmann.
Aksakof define animismo na sua obra como “Fenômenos psíquicos inconscientes
se produzidos fora dos limites da esfera corpórea do médium ou extramediúnicos
(transmissão do pensamento, telepatia,
telecinesia, movimentos de objetos sem contacto, materialização)”.
O
papel do médium, como o próprio nome já indica, é intermediar, permitir a
comunicação entre o mundo material e espiritual, entre encarnados e
desencarnados e vice-versa. E o que se tem constatado é que essas comunicações
muitas vezes vêm revestidas de traços reconhecidamente do próprio médium,
quando não sendo, toda ela, a exposição de suas experiências. Esse é o ponto
onde se apegaram os antagonistas da Doutrina Espírita para colocar em xeque a
veracidade das comunicações mediúnicas e da honestidade do médium.
Importante
ressaltar que o termo animismo não foi utilizado pelos Espíritos Superiores ou
por Allan Kardec nas obras básicas e por isso lança-se mais um questionamento:
Se não existe nas obras fundamentais, como seu uso tornou-se tão comum no meio
Espírita? Na dúvida é sempre interessante voltar ao princípio, neste caso, ao
Livro dos Médiuns, o mais completo compêndio “sobre a teoria de todos os gêneros de manifestações, os meios de
comunicação com o Mundo Invisível, o desenvolvimento da mediunidade, as
dificuldades e os escolhos que se podem encontrar na prática do Espiritismo.”
No
capítulo XIX, item 223, questão 2, o codificador pergunta se “As comunicações,
escritas ou verbais, podem também provir do próprio Espírito encarnado no
médium? Ao que os Espíritos Superiores respondem: “A alma do médium pode se comunicar como a de qualquer outro; se ela
goza de um certo grau de liberdade, descobre suas qualidades de Espírito. Disso
tendes a prova nas almas das pessoas vivas que vêm vos visitar, e se comunicar
convosco pela escrita, frequentemente, sem que as chameis. Porque, ficai
sabendo, entre os Espíritos que evocais, há os que estão encarnados na Terra;
então, eles vos falam como Espíritos e não como homens.”
A
exemplo do item acima citado verifica-se que apesar de não utilizar o termo,
existe nas obras da codificação, principalmente no Livro dos Médiuns, capítulo
XIX, e, em O Livros dos Espíritos, questões 400 a 455, riquíssimo conteúdo
sobre o assunto, que deve ser analisado com muita atenção, haja vista a
pluralidade de detalhes sobre as diferentes formas de manifestação da alma.
Na
análise desses textos nota-se que o Codificador atribui aos fenômenos
produzidos pela alma do encarnado uma única origem que ele designa como “Emancipação da Alma”. Que em
decorrência dela uma diversidade enorme de fenômenos podem ser provocados,
desde o sono, sonho, sonambulismo, êxtase, letargia, catalepsia, mortes
aparentes, transmissão de pensamentos, desdobramentos conscientes ou
inconscientes, dupla vista e muitos outros. No resumo teórico do sonambulismo,
êxtase e dupla vista, constante em “O Livro dos Espíritos”, Kardec afirma
referindo-se a tais fenômenos, “É um
atributo da alma, uma faculdade inerente a todas as partes do ser incorpóreo
que existe em nós e cujos limites não são outros senão os assinados à própria
alma”.
Na
introdução da mesma obra o Codificador deixa claro que “para se designarem coisas novas são precisos termos novos. Assim o
exige a clareza da linguagem, para evitar a confusão inerente à variedade de
sentidos das mesmas palavras.” Portanto, coloca-se como hipótese, observada
a prudência que se pautam os Espíritos Superiores e Kardec, que se estes
adotaram o termo “Emancipação da Alma” ao invés de “animismo” é que o mesmo não
deixaria dúvida quanto ao seu verdadeiro sentido, evitando-se a anfibologia.
No
entanto, apesar de não estar na codificação, não há inconvenientes quanto a
utilização do termo “Animismo” na explicação dos fenômenos espíritas, desde que
compreendido o seu sentido literal, que é “produção
de um fenômeno causado pela ação da alma”. A afirmativa se fundamenta no
fato de muitos se confundirem e disseminarem definições equivocadas. Atrapalham-se
na identificação de causa e efeito, quando não o definem como sinônimo de charlatanismo
ou mistificação.
Chega-se
a conclusão, portanto, que a falta de conhecimento, habilidade e compreensão do
assunto têm inibido a ação de muitos médiuns iniciantes, por medo da acusação
dos próprios colegas de trabalho que se precipitam e condenam sem chance de
defesa. É de se deixar bem claro que o animismo deve ser tratado com
naturalidade, pois é inerente ao trabalho do médium, principalmente iniciante, o
qual deve ser plenamente amparado e esclarecido sobre os fenômenos medianímicos
a que todos estão sujeitos.
Artigo elaborado pela turma de Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita - ESDE, Tomo Único, ano 2014, do Grupo Espírita Eurípedes Barsanulfo - Cristalina-GO.
Referências Bibliográficas:
1. KARDEC, Allan. O Livro dos médiuns. Tradução de Guillon Ribeiro. 80. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007.
2. _______________. O Livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 91. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007.
3. AKSAKOF, Alexandre. Animismo e Espiritismo. 1890.
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